domingo, 31 de julho de 2016

A Afabilidade e a Doçura

   
         A benevolência para com os semelhantes, fruto do amor ao próximo, produz a afabilidade e a doçura, que são a sua manifestação. Entretanto, nem sempre se deve fiar nas aparências, pois a educação e o traquejo do mundo podem dar o verniz dessas qualidades. Quantos há, cuja fingida bonomia é apenas uma máscara para uso externo, uma roupagem cujo corte bem calculado disfarça as deformidades ocultas! O mundo está cheio de pessoas que trazem o sorriso nos lábios e o veneno no coração; que são doces, contanto que ninguém as moleste, mas que mordem à menor contrariedade; cuja língua, doirada quando falam face a face, se transforma em dardo venenoso, quando falam por trás.
          A essa classe pertencem ainda esses homens que são benignos fora de casa, mas tiranos domésticos, que fazem a família e os subordinados suportarem o peso do seu orgulho e do seu despotismo, como para compensar o constrangimento a que se submetem lá fora. Não ousando impor sua autoridade aos estranhos, que os colocariam no seu lugar, querem pelo menos ser temidos pelos que não podem resistir-lhes. Sua vaidade se satisfaz com o poderem dizer: “Aqui eu mando e sou obedecido”, sem pensar que poderiam acrescentar, com mais razão: “E sou detestado”.
          Não basta que os lábios destilem leite e mel, pois se o coração nada tem com isso, trata-se de hipocrisia. Aquele cuja afabilidade e doçura não são fingidas, jamais se desmente. É o mesmo para o mundo ou na intimidade, e sabe que se podem enganar os homens pelas aparências, não podem enganar a Deus.

LÁZARO
Paris, 1861

O Evangelho Segundo o Espiritismo; Allan Kardec

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Caracteres do Homem de Bem

918. Por que sinais se pode reconhecer no homem o progresso real que deve elevar o seu Espírito na hierarquia espírita?

- O Espírito prova a sua elevação quando todos os atos de sua vida corporal representam a prática da Lei de Deus e quando antecipadamente compreende a vida espiritual.

Comentário de Kardec: O verdadeiro homem de bem é aquele que pratica a lei de justiça, de amor e de caridade na sua mais completa pureza. Se interrogar sua consciência sobre os atos praticados, perguntará se não violou essa lei, se não cometeu nenhum mal, se fez todo o bem que podia, se ninguém teve de se queixar dele. Enfim, se fez para os outros tudo o que queria que lhe fizessem.
          O homem possuído pelo sentimento de caridade e de amor ao próximo faz o bem pelo bem, sem esperança de recompensa, e sacrifica o seu interesse pela justiça.
          Ele é bom, humano e benevolente para com todos, porque vê irmãos em todos os homens, sem exceção de raças ou de crenças.
          Se Deus lhe deu o poder e a riqueza, olha essas coisas como um depósito do qual deve usar para o bem, e disso não se envaidece porque sabe que Deus, que lhos deu, também poderá retirá-los.
          Se a ordem social colocou homens sob sua dependência, trata-os com bondade e benevolência porque são seus iguais perante Deus; usa de sua autoridade para lhes erguer o moral e não para os esmagar com o seu orgulho.
          É indulgente para com as fraquezas dos outros porque sabe que ele mesmo tem necessidade de indulgência e se recorda destas palavras do Cristo: “Que aquele que estiver sem pecado atire a primeira pedra”.
          Não é vingativo: a exemplo de Jesus, perdoa as ofensas para não se lembrar senão dos benefícios, porque sabe que lhe será perdoado assim como tiver perdoado.
          Respeita, enfim, nos seus semelhantes, todos os direitos decorrentes da lei natural, como desejaria que respeitassem os seus.


Livro dos Espíritos; Allan Kardec

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

O Ponto de Vista

"Sob o ponto de vista da vida terrena, em cujo centro se coloca, tudo se agiganta ao seu redor. O mal o atinge, como o bem que toca aos outros, tudo adquire aos seus olhos enorme importância. É como o homem que, dentro de uma cidade, vê tudo grande em seu redor: os cidadãos eminentes como os monumentos; mas que, subindo a uma montanha, tudo lhe parece pequeno. Assim acontece com aquele que encara a vida terrena do ponto de vista da vida futura: a humanidade, como as estrelas no céu, se perdem na imensidade; ele então se apercebe de que grandes e pequenos se confundem como as formigas num monte de terra; que operários e poderosos são da mesa estatura; e ele lamenta essas criaturas efêmeras, que tanto se esfalfam para conquistar uma posição que os eleva tão pouco e por tão pouco tempo. É assim que importância atribuída aos bens terrenos está sempre na razão inversa da fé que se tem na vida futura."

O Evangelho Segundo o Espiritismo; Allan Kardec

domingo, 3 de janeiro de 2016

O Suicídio e o Espiritismo

957. Quais são, em geral, em relação ao estado do Espírito, as consequências do suicídio?
                  “Muito diversas são as consequências do suicídio. Não há penas determinadas e, em todos os casos, correspondem sempre às causas que o produziram. Há, porém, uma consequência a que o suicida não pode escapar: é o desapontamento. Mas, a sorte não é a mesma para todos; depende das circunstâncias. Alguns expiam a falta imediatamente, outros em nova existência, que será pior do que aquela cujo curso interromperam”. (...) 

                  A afinidade que permanece entre o Espírito e o corpo produz, nalguns suicidas, uma espécie de repercussão do estado do corpo no Espírito, que, assim, a seu mau grado, sente os efeitos da decomposição, donde lhe resulta uma sensação cheia de angústias e de horror, estado esse que também pode durar pelo tempo que devia durar a vida que sofreu interrupção. Não é geral este efeito; mas, em caso algum, o suicida fica isento das consequências da sua falta de coragem e, cedo ou tarde, expia, de um modo ou de outro, a culpa em que incorreu.
                  Assim é que certos Espíritos, que foram muito desgraçados na Terra, disseram ter-se suicidado na existência precedente e submetido voluntariamente a novas provas para tentarem suportá-las com mais resignação. Em alguns verifica-se uma espécie de ligação à matéria, de que inutilmente procuram desembaraçar-se, a fim de voarem para mundos melhores, cujo acesso, porém, se lhes conserva interdito. A maior parte deles sofre o pesar de haver feito uma coisa inútil, pois que só decepções encontram.
                  A religião, a moral, todas as filosofias condenam o suicídio como contrário às leis da Natureza. Todas nos dizem, em princípio, que ninguém tem o direito de abreviar voluntariamente a vida. Entretanto, por que não se tem esse direito? Por que não é livre o homem de pôr termo aos seus sofrimentos? Ao Espiritismo estava reservado demonstrar, pelo exemplo dos que sucumbiram que o suicídio não é uma falta, somente por constituir infracção de uma lei moral, consideração de pouco peso para certos indivíduos, mas também um ato estúpido, pois que nada ganha quem o pratica, antes o contrário se dá, como no-lo ensinam, não a teoria, porém os fatos que ele nos revela.

O Livro dos Espíritos
Allan Kardec

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

O Maravilhoso e o Sobrenatural

14. Resumimos nossa opinião nas proposições
seguintes:

1º) Todos os fenômenos espíritas têm como princípio a existência da alma, sua sobrevivência à morte do corpo e suas manifestações;

2º) Decorrendo de uma lei da Natureza, esses fenômenos nada têm de maravilhoso, nem de sobrenatural, no sentido vulgar dessas palavras;

3º) Muitos fatos são considerados sobrenaturais porque a sua causa não é conhecida; ao lhe determinar a causa, o espiritismo os devolve ao domínio dos fenômenos naturais;

4º) Entre os fatos qualificados de sobrenaturais, o espiritismo demonstra a impossibilidade de muitos e os coloca entre as crenças supersticiosas;

5º) Embora o espiritismo reconheça um fundo de verdade em muitas crenças populares, ele não aceita absolutamente que todas as estórias fantásticas criadas pela imaginação sejam da mesma natureza;

6º) Julgar o Espiritismo pelos fatos que ele não admite é dar prova de ignorância e desvalorizar por completo a própria opinião;

7º) A explicação dos fatos admitidos pelo Espiritismo, de suas causas e suas conseqüências morais, constitui toda uma Ciência e toda uma Filosofia que exigem estudo sério, perseverante e aprofundado;

8º) O Espiritismo só pode considerar como crítico sério àquele que tudo viu e estudou, em tudo se aprofundando com paciência e a perseverança de um observador consciencioso; que tenha tanto conhecimento do assunto como adepto mais esclarecido; que não haja, portanto, adquirido seus conhecimentos nas ficções literárias da ciência; ao qual não se possa opor nenhum fato por ele desconhecido, nenhum argumento que ele não tenha meditado e que não tenha refutado apenas por meio da negação, mas por outros argumentos mais decisivos; aquele enfim, que pudesse apontar uma causa mais lógica para os fatos averiguados. Esse crítico ainda está para aparecer.


O Livro dos Médiuns; Allan Kardec

Origem e Natureza dos Espíritos

76. Como podemos definir os Espíritos?
Podemos dizer que os Espíritos são os seres inteligentes da criação. Eles povoam o Universo, além do mundo material.

Comentário de Kardec: Nota. — A palavra Espírito é aqui empregada para designar os seres extra-corpóreos e não mais o elemento inteligente universal.

77. Os Espíritos são seres distintos da Divindade, ou não seriam mais do que emanações ou porções da Divindade, por essa razão chamados filhos de Deus?

Meu Deus! São Sua obra, precisamente como acontece com um homem que faz uma máquina; esta é obra do homem e não ele mesmo. Sabes que o homem, quando faz uma coisa bela e útil, chama-a de sua filha, sua criação. Pois bem, dá-se o mesmo com Deus: nós somos Seus filhos, porque somos Sua obra.

78. Os Espíritos tiveram princípio ou existem de toda a eternidade, como Deus?

Se os espíritos não tivessem tido princípio, seriam iguais a Deus; mas, pelo contrário, são sua criação, submetidos à sua vontade. Deus existe de toda a eternidade, isso é incontestável; mas quando e como ele nos criou não o sabemos. Podes dizer que não tivemos princípio, se com isso entendes que Deus, sendo eterno, deva ter criado sem cessar; mas quando e como cada um de nós foi feito, eu te repito, ninguém o sabe; isso é mistério.
79. Uma vez que há dois elementos gerais do Universo: o inteligente e o material, poderíamos dizer que os Espíritos são formados do elemento inteligente, como os corpos inertes são formados do material?

É evidente. Os Espíritos são individualizações do princípio inteligente, como os corpos são individualizações do princípio material; e a maneira dessa formação é que desconhecemos.
80. A criação dos Espíritos é permanente ou verificou-se apenas na origem dos tempos?
E permanente, o que quer dizer que Deus jamais cessou de criar.

81. Os Espíritos se formam espontaneamente ou procedem uns dos outros?

Deus os criou, como a todas as outras criaturas, pela Sua vontade; mas repito ainda uma vez que a sua origem é um mistério.
82. É certo dizer que os Espíritos são imateriais?

Como podemos definir uma coisa, quando não dispomos dos termos de comparação e usamos uma linguagem insuficiente? Um cego de nascença pode definir a luz? Imaterial não é o termo apropriado; incorpóreo, seria mais exato; pois deves compreender que, sendo uma criação, o Espírito deve ser alguma coisa. É uma matéria quintessenciada, para a qual não dispondes de analogias, e tão eterizada que não pode ser percebida pelos vossos sentidos.

Comentário de Kadec: Dizemos que os Espíritos são imateriais, porque a sua essência difere de tudo o que conhecemos pelo nome de matéria. Um povo de cegos não teria palavras para exprimir a luz e os seus efeitos. O cego de nascença julga ter todas as percepções pelo ouvido, o olfato, o paladar e o tato; não compreende as idéias que lhe seriam dadas pelo sentido que lhe falta. Da mesma maneira, no tocante à essência dos seres super-humanos, somos como verdadeiros cegos. Não podemos defini-los, a não ser por meio de comparações sempre imperfeitas ou por um esforço da imaginação.

83. Os Espíritos terão fim? Compreende-se que o princípio de que eles emanam seja eterno, mas o que perguntamos é se a sua individualidade terá um termo, e se, num dado tempo, mais ou menos longo, o elemento de que são formados não se desagregará e não retornará à massa de que saiu, como acontece com os corpos materiais. É difícil compreender que uma coisa que teve começo não tenha fim.

— Há muitas coisas que não compreendeis porque a vossa inteligência é limitada; mas isso não é razão para as repelirdes. O filho não compreende tudo o que o pai compreende, nem o ignorante, tudo o que o sábio compreende. Nós te dizemos que a existência dos Espíritos não tem fim; é tudo quanto podemos dizer por enquanto.

O Livro dos Espíritos; Allan Kardec

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

A Realeza de Jesus

      4 -   O reino de Jesus não é deste mundo. Isso todos compreendem. Mas sobre a Terra ele não terá também uma realeza? O título de rei nem sempre exige o exercício do poder temporal. Ele é dado, por consenso unânime, aos que, por seu gênio, se colocam em primeiro lugar em alguma atividade, dominando o seu século e influindo sobre o progresso da humanidade. É nesse sentido que se diz: o rei ou o príncipe dos filósofos, dos artistas, dos poetas, dos escritores, etc. Essa realeza, que nasce do mérito pessoal, consagrada pela posterioridade, não tem muitas vezes maior preponderância que a dos reis coroados? Ela é imperecível, enquanto a outra depende das circunstâncias; ela é sempre abençoada pelas gerações futuras, enquanto a outra é, às vezes, amaldiçoada. A realeza terrena acaba com a vida, mas a realeza moral continua a imperar, sobretudo, depois da morte. Sob esse aspecto, Jesus não é um rei mais poderoso que muitos potentados? Foi com razão, portanto, que ele disse a Pilatos: Eu sou rei, mas o meu reino não é deste mundo.

O Evangelho Segundo o Espiritismo; Allan Kardec